domingo, 10 de novembro de 2013

O OFÍCIO DOS PAIS

O Ofício dos Pais

Senhor Carlos, vulgo Cacá, era pescador e agricultor por profissão, muito extrovertido, gostava de contar muitas histórias e piadas. Ensinava seus filhos o ofício, dizia-lhes que de fome não morreriam! Conhecia e conhecido por todos, fazia muitas algazarras nas ruas, de um quarteirão ao outro mexia com os transeuntes. Nas horas vagas ia pescar, convidava os vizinhos e conhecidos, varas, molinetes, iscas, anzóis e barcos, aquilo o deixava muito feliz. Dona Ninica, diarista nas semanas, aos fins de semanas era a mãe mais dedicada ao lar e família. Preocupava-se com a educação dos filhos, acompanhava suas notas e desempenhos escolares. Dizia para aproveitarem enquanto o tempo favorecia o saber, pois, os desfavoráveis chegariam. Qualidades de laboriosidade, honestidade e otimismo ajudaram seus filhos, Tiago, Pedro, André e João a serem bons cidadãos.
O pai aproveitava a hora do almoço ou jantar para mostrar os peixes aos garotos, ensinava-lhes que precisavam ser iguais aos peixes bons, pois as atitudes indesejáveis como mentira, roubo, desonestidade e a lista parecia crescer com os dias, eram iguais aos peixes podres e cheiravam mal.

HORA DE ESTUDAR

Com o começo de um novo ano, havia chegado o momento tão esperado, Joãozinho agora caminha com seu outro irmão rumo à escola; os outros dois, Tiago e Pedro, estudavam no período vespertino. Achou diferente aquela correria, o sinal para entrar em sala, a fila que se fazia, a chamada de presença que sempre um engraçadinho respondia: Presunto, por mais repetitivo que fosse as risadas eram garantidas. Em casa Joãozinho era um tagarela, mas na escola a timidez destacava-se. Sua professora Dona Teresinha, loira, olhos azuis, magra, estatura mediana, um doce; com ela ele aprendeu a ler, formar frases, calcular (somar, subtrair, dividir e multiplicar), da primeira à quarta série, era o paraíso estudantil, lecionava-se com facilidade de aprendizagem.
No fim daquele ano letivo, Joãozinho poupou em seu cofrinho as economias de quatro anos, uma miséria, mas o menino foi até o bazar e comprou um pingente de cachorrinho para sua professora em agradecimento pela sua dedicação e carinho. Em sala de aula, último dia, ele deu o presente para a professora que surpresamente colocou no pescoço toda feliz. Joãozinho volta pra casa feliz, chutando pedras, conseguira realizar uma coisa que há muito queria dar de coração.
No seguinte ano, as coisas mudaram, não era apenas uma professora e sim nove, sendo a carrasco mor a professora de matemática Dona Tisuko. Era baixa, magra, cabelo liso, preto, curto, filha de japoneses, sistemática e perfeccionista, sem tato e muito parcial em classe. Qualidades? Sim, ela possuía, mas Joãozinho não consegue se lembrar. Antipaticamente, chamava o pobre menino de burro para seus colegas ouvirem, seu chavão consistia em dizer que desse jeito não dá, né. Uma das séries mais difíceis que Joãozinho passou foi a quinta série por bruscas mudanças; resultou em passar de ano raspando em matemática, o que decepcionou Tisuko, torcendo agora para ele cair em sua turma.
Na sexta série, Joãozinho estava novamente com Tisuko, infelizmente ele bombou unicamente em matemática, na recuperação de fim de ano. O olhar da professora era de vitória, conseguiu fuzilar o jovem e, olhando pra ele disse que futuramente a agradeceria por não ter deixado passar para sétima série. O menino saiu como que nocauteado, foi a primeira vez que se recorda de enxergar o mundo cinza. Seus pés automaticamente fazem o caminho para casa. O coração bate descompassado, seus olhos jorram águas, não sabe da reação dos pais, teme por sua situação. Entra na casa do escadão, sua mãe acaba de chegar do trabalho e ao fitar o garoto entende que não passou de ano. Adianta-se a dizer que perdera um ano de sua vida e que isto lhe sirva de lição; bola pra frente, a vida continua.
Joãozinho vai à cama, deita-se, procura achar explicações, mas tudo parecia vazio, fracasso, essa palavra passava por sua mente. Chorou, chorou até dormir.
Agora, João, cursa novamente a sexta série, mudou muito, deixou a timidez de lado, aprendeu a malícia das milícias estudantis. Ficara esperto, conseguia responder a altura ou sobrepujar seus adversários; começou a trabalhar de Office-boy, via independência em sua vida. Na escola, chegando à noite do trabalho, passou pela Brasília bege de Dona Tisuko. Calmamente na frente de observadores esvaziou seus quatro pneus, era uma ação antiestresse pra ele. Houve uma ocasião que ao sair da sala, as carteiras e cadeiras estavam em chamas; inventou pra ser popular que seu pai tinha acertado na loteria e em poucos dias seriam os mais novos ricos da cidade. Começou uma fila pra serem amigos de João, convites mil não faltavam. Entretanto, toda mentira tem pernas curtas e logo os curiosos começaram a rodear seu pai que desmentiu a história.
À noite, houve um black out, os atuais apagões, tudo escuro, Sr. Cacá pergunta para João que tipo de peixe era ele? Na mesa, velas e uma sopa de feijão com ovos cozidos, um caldeirão e todos a comê-la. João responde que não era peixe, poderia ser muito bem um feijão. Feijão quando não guardado na geladeira estraga, você pode comparar-se com qualquer outra coisa, o fato é que cheira mal. André, Pedro e Tiago saem da mesa e vão para o quarto, Ninica recolhe a louça, todos entenderam que o momento era de correção e, costumeiramente deixavam o pai administrar a devida disciplina.
João aos gritos tentava refutar sem êxito as cobranças do velho. Hoje você foi um peixe podre, o que ganhou por mentir? Amigos do seu suposto dinheiro; vergonha, doravante vão apontá-lo como o mentiroso. Acha que saiu no lucro? Cada admoestação do pai entrava uma facada em seu coração, mas o semblante mantinha-se varonil. Seu Carlos o fez sentar no sofá e o que viu foi um garoto querendo ganhar espaço, amigos de uma forma tola. Aconselhou e João não aguentou mais, pôs se a chorar. Deitou sua cabeça  no colo de seu pai,  qual cafuné na cabeça, cantava uma música que acalmou sua criança. Cacá percebeu que o pequeno após aquela conversa fora ajudado a ser um nobre homem.  Desmaiado de sono, Cacá o leva em seus braços e o coloca no beliche, beija-o, olha ao redor e seus filhos fixam na cena. Beija Pedro, Tiago e André e deseja-lhes uma boa noite.
Caminha para seu quarto pensativo, talvez triste por não prever tal situação, deita na cama, sua esposa começa a lhe fazer um cafuné e canta uma música relaxante que faz seu Carlos embalar no sono, sua esposa Ninica protege-o para que pesque seus mais lindos sonhos.

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"ESPERAREI"

Esperarei domingo; Esperarei sorrindo; Esperarei sonhando; Esperarei dormindo; Esperarei um amigo, Um abrigo, um lindo dia de sol.