domingo, 22 de abril de 2012

O TEMPO

No vai e vem da cadeira de balanço, as mãos tremulam por imposição da idade, a mente já não é mais a mesma, a visão turva tenta enxergar o óbvio, mesmo com óculos de altíssimo grau. A boca parece soltar sons indecifráveis, a conversa ora a faz rir e ora a faz chorar.

Qualquer observador ficaria pasmo por tal cena, não entendendo por que o tempo é tão implacável com o corpo, mente, nos deixando a deriva de nossa existência.

Sai repentinamente do casarão imponente, uma construção do início do século XIX, uma mulher jovem trajando roupas brancas com uma bandeja de medicamentos nas mãos. Ao chegar perto da idosa senhora desligada da realidade, sorri e diz num tom amoroso: Hora de seu remedinho, querida!

A senhora idosa continua a resmungar, ignorando a presença da dócil moça.
Ela por sua vez, abre a boca da paciente, coloca um comprimido, água acompanha o medicamento que desce pela garganta abaixo. Outra vez, coloca um comprimido de cor rosa, verde, branco... E a tarefa filantropa se repete à medida que a enfermeira executa seu trabalho. A cadeira continua a balançar, a senhora continua olhando fixamente para um lugar, e sua boca continua a balbuciar palavras não entendidas.

Na minha observação, parei, meditei, será que está pensando em seu passado, em seus entes queridos, em suas realizações, em seus amigos. Tantas coisas poderiam estar passando por seu cérebro.
Entrei através daquele portão trabalhado por mãos destras de serralheiro. Aproximei da recepção rodeada de móveis antigos. Fui indagado gentilmente do objetivo de minha visita, e, fiz uma humilde doação  para o asilo. E após conhecer melhor aquela casa, seu funcionamento e rotina, minha curiosidade não se dissipou por causa da figura idosa na cadeira de balanço. Quis saber se tinha familiares, e a resposta foi positiva, foi abandonada, não tem visitas há mais de oito anos.

Com minha face horrorizada por tal história, a encarregada me disse, que aquela mulher na cadeira de balanço ajudou muito este asilo, ajudou muito sua família, tem duas filhas, ela foi uma pessoa que passou seus sentimentos, suas emoções através da escrita, pois era considerada uma grande escritora, autora de grandes obras da literatura brasileira.

Meus olhos encheram de lágrimas, não porque sou uma pessoa sentimental, mas a causa da estadia da senhora me estarrecia. Fui ao seu encontro, no seu colo um livro, o último que havia editado. Segurei em suas mãos trêmulas, e tremendo olhei no fundo de seus olhos agradecido por sua contribuição á humanidade. Olhos nos olhos, lágrimas em cada face, ela continuava a falar e eu junto com ela continuei a agradece-la.

Após um bom tempo fui embora com a resolução de contínua ajuda ao asilo, e triste, porque uma pessoa qualquer que seja não merece esse fim, especialmente os da raça humana.

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"ESPERAREI"

Esperarei domingo; Esperarei sorrindo; Esperarei sonhando; Esperarei dormindo; Esperarei um amigo, Um abrigo, um lindo dia de sol.